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quarta-feira, junho 01, 2011

A dignidade da política

 - Nicias Ribeiro- Engenheiro eletrônico- nicias@uol.com.br

                   No momento em que os acontecimentos contagiam a política do Brasil, com o verme da corrupção e da imoralidade, uma amiga nos presenteia com um livro de Hannah Arendt, cientista política e filósofa, nascida em Hanover, Alemanha, em 1906, que foi obrigada a fugir do seu país, em 1933, quando Hitler subiu ao poder, após ter sido presa pelo regime nazista por sua condição de judia.
                   Essa obra nos chega às mãos, no momento em que estamos mergulhados num mar de dúvidas e inquietações, pela crise que inunda o país, ou, parafraseando a autora, “será que a política ainda tem, de algum modo, algum sentido?”...
                   Na referida obra, cujo título tomamos emprestado para nomear este artigo, responde-nos a autora que o sentido da política é a liberdade. Liberdade que é a condição estrita e exclusiva do homem, que se expressa na ação, na interação de homens plurais.
                   Movendo-se entre o passado e o futuro, o pensamento de Hannah Arendt chama-nos atenção pelos elementos de criticidade e também de experimentação, com vistas às mudanças capazes de restaurar a “dignidade da política”. Aliás, a autora analisa a tradição herdada do passado histórico e filosófico, buscando descobrir as verdadeiras origens dos conceitos tradicionais, a fim de destilar deles a sua primitiva essência, que tão melancolicamente evadiu-se das próprias palavras-chave da linguagem política – liberdade e justiça, autoridade e razão, responsabilidade e virtude, poder e glória – deixando atrás de si formas vazias, com as quais se dão todas as expli cações ou nada se explica. Dessa forma, nos aventuramos a dizer que uma das preocupações centrais do seu pensamento é com o que estamos fazendo. É com a direção que desejamos dar ao nosso conhecimento, de tal modo que a destruição de nossas categorias de pensamento e nossos padrões de juízo nos livre da perplexidade em que estamos mergulhados nos dias atuais. Com efeito, “já não podemos nos dar ao luxo de extrair aquilo que foi bom no passado e simplesmente chamá-lo de nossa herança, deixar de lado o que foi mau e simplesmente considerá-lo um peso morto, que o tempo por si mesmo relegará ao esquecimento. Esta é a realidade em que vivemos. É por isso que são inúteis todos os esforços de escapar do horror do presente, refugiando-se na nostalgia de um passado ainda eventualmente intacto ou no esquecimento antecipado de um futuro melhor”.
                   É neste contexto que a autora articula compreensão e ação, isto é: filosofia e política, afirmando que, “se a essência de toda a ação – e em particular da ação política – é realizar um novo começo, então a compreensão é a outra face da ação, a saber: aquela forma de cognição que, diferentemente de muitas outras, permite aos homens de ação (e não aos que se engajam na contemplação), no final das contas, aprender a lidar com o que irrevogavelmente passou e reconciliar-se com o que inevitavelmente existe”.
                   Como Hannah Arendt, nós também cremos numa “reconciliação”, porque acreditamos firmemente na promessa inscrita na existência do próprio ser humano e na sua capacidade de ultrapassar tempos sombrios. E ao analisarmos o seu pensamento, ousamos imaginar que ela, se vivesse nos dias atuais, aplaudiria o fato do Brasil estar sendo passado a limpo. Entretanto, este fato só teria relevância, pensaria ela, se acompanhado de ações efetivas que resgatassem a dignidade da política. Aliás, o seu pensamento é atual e parece ter sido escrito para o Brasil, até porque a nossa gente precisa voltar a crer nos seus políticos, cujas ações correspondam aos sonhos e anseios de um a sociedade, que não admite mais o exercício da política divorciado do respeito aos conceitos morais.
                   Na década de 50, o Brasil sonhava com o crescimento urgente. Sonhávamos com o fim da inflação. Na era JK, crescemos 50 anos em 5. Nos anos 90, controlamos a inflação e reorganizamos a nossa economia. Na década passada voltamos a crescer e queremos continuar crescendo, sem inflação e sem corrupção. Daí a decepção da sociedade a cada escândalo de corrupção como este da Assembléia Legislativa, cujos atos ocorreram na legislatura passada. E é por isso que, mais do que nunca, é preciso restaurarmos a dignidade da política.

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